Capitaes de Areia by Jorge Amado

Capitaes de Areia by Jorge Amado

Author:Jorge Amado [Amado, Jorge]
Format: epub
Published: 2010-09-09T03:00:00+00:00


Quase junto do palácio do governo pararam novamente. Professor ficou de giz na mão esperando que saísse do ponto do bonde um pato. Pedro Bala assoviava ao seu

lado. Breve teriam o dinheiro para (p. 128)um bom almoço e ainda para levar um presente para Clara, a amante do Querido-de-Deus, que fazia anos naquele dia. Uma velhota deu dez tostões por seu desenho. A velhota era feia e Professor tinha conservado sua feiúra no desenho. Pedro Bala notou:

--Se tu tivesse feito ela mais bonita e mocinha, ela te dava mais. Professor riu. Assim passaram a manhã, Professor fazendo a cara dos que vinham pela rua, Pedro Bala recolhendo as pratas ou os níqueis que jogavam. Quase meio-dia

veio um homem que fumava numa piteira que parecia cara. Pedro Bala correu para avisar ao

Professor:

--Faz deste que parece que é um pato cheio da nota... Professor começou a desenhar a figura magra do homem. A piteira longa, os cabelos encaracolados que apareciam sob o chapéu. O homem trazia também um livro na mão

e Professor teve um desejo irresistível de fazer o desenho do homem lendo o livro. O homem ia

passando, Pedro Bala chamou sua atenção:

--Olhe seu retrato, senhor.

O homem tirou a longa piteira da boca, perguntou a Bala:

--O que, meu filho?

Pedro Bala apontou o desenho em que o Professor trabalhava. O homem aparecia sentado (se bem não houvesse cadeira nem nada estava sentado no ar), fumando sua piteira

e lendo seu livro. O cabelo

encaracolado voava sob o chapéu. O homem examinou o desenho atentamente, foi espiá-lo em diversos ângulos, nada dizia. Quando o Professor deu o trabalho por concluído,

ele perguntou:

--Onde você aprendeu desenho, meu caro?

--Em lugar nenhum...

--Em lugar nenhum? Como?

--É, sim senhor...

--E como desenha?

--Me dá vontade, pego, desenho.

O homem estava um pouco incrédulo, mas sem dúvida recordou outros exemplos no fundo da sua memória:

--Quer dizer que você nunca estudou desenho?

(p. 130)

--Nunca, não senhor.

--Posso garantir falou Pedro Bala. --Nós mora junto, eu sei.

--Então é uma verdadeira vocação... --murmurou o homem. Voltou ao examinar o desenho. Tirou uma longa fumaçada da sua piteira. Os dois meninos olhavam para a piteira encantados. O homem perguntou ao Professor:

--Por que você me retratou sentado e lendo o livro?

Professor coçou a cabeça como se fosse uma coisa difícil de responder. Pedro Bala quis falar, mas nada disse, estava atarantado. Por fim Professor explicou:

--Pensei que sentava melhor pro senhor... --coçou de novo a cabeça. - Não sei mesmo...

--É uma verdadeira vocação... --murmurou o homem em voz mais baixa, assim com o jeito de quem havia feito uma descoberta.

Pedro Bala esperava o níquel, mesmo porque o guarda já os olhava desconfiado da esquina. Professor espiava a piteira do homem longa, desenhada a fogo, uma maravilha.

Mas o homem continuou:

--Onde você mora?

Pedro Bala não deu tempo a que Professor respondesse. Foi ele quem falou:

--A gente mora na Cidade de Palha...

O homem meteu a mão no bolso e tirou um cartão:

--Você sabe ler?

--A gente sabe, sim senhor respondeu Professor.

--Aí está meu endereço. Eu quero que você me procure. Talvez possa fazer alguma coisa por você.

Professor tomou o cartão.



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